Palavras do Prof. Dr. Sérgio Luiz Souza Araújo na abertura do Seminário “Direito de punir versus direito de liberdade para os povos do livro e de Allah” :
Este evento tem em mira refletir e discutir através de atividades lúdicas, dramatizações, música e poesia, temas e ideologias religiosas e políticas que estão na origem do processo penal. Michel Foucault já nos advertia que, se quiséssemos conhecer a verdadeira personalidade do Estado, o seu verdadeiro caráter, bastaria-nos ter acesso aos processos criminais arquivados no poder judiciário desse Estado. É pelo processo penal que melhor se percebem as relações entre o homem e o Estado. Jus libertatis versus Jus Puniendi.
O título do evento, direito de punir e direito de liberdade para os povos do livro e de Allah, diz respeito à herança que nos foi legada pelas três grandes religiões monoteístas. Os judeus tiveram a sua revelação através da Torah; Os cristãos receberam os evangelhos. Segundo Pascal os evangelhos possuem tamanha beleza e sabedoria que só poderiam ter sido ditados por um Deus. Com a adoção do cristianismo como religião oficial do Império Romano no séc. IV pelo Imperador Constantino, a religião deixa de ser uma seita, ganha grande impulso e serviu de elemento de coesão interna e política para o sistema de governo.
Mas e os árabes, teriam sido abandonados por Deus? Eis que no séc. VII, numa região tribal da península arábica, recolhido em uma caverna, numa montanha próxima à cidade de Meca, um homem de 40 anos de idade, habituado a trabalhos rústicos e manuais, recebe uma presença misteriosa que lhe manda recitar. Mas ele não sabia recitar. O anjo então o abraça e quando estava chegando no limite de sua resistência física saiu o primeiro verso. Daí por diante, durante 22 anos, o Profeta Mohammed iria transmitir os versos que comporiam o Alcorão, o livro sagrado do Islã. O Profeta, chefe de estado e líder religioso, sempre dizia que não veio trazer nenhuma religião nova, mas confirmar as revelações precedentes feitas aos judeus e cristãos.
No Séc. XI nada parecia ameaçar o poder do Papado. Bem, quase nada. A expansão do Islã, religião criada no sec. VII e que, como menos de 100 anos depois da vinda de Mohamed já tinha construído um Império que ia da Espanha à Índia, deixou o Vaticano em alerta. Hoje, o Islã, a religião que mais cresce no mundo, conta com mais de um bilhão e duzentos milhões de fiéis.
A tensão entre essas duas religiões acabou virando guerra. Armado pelos Turcos, o imperador Bizantino Aleixo pediu ajuda ao Ocidente. Diante disso, em 1095 o papa Urbano II conclamou os nobres europeus a reconquistar os lugares santos da Palestina que estavam sob o domínio do Islã. Durante mais de duzentos anos os cristãos estiveram em guerra com os muçulmanos causando um fosso cujos rancores ainda permanecem nos dias de hoje.
As cruzadas. Esse será o tema do terceiro grupo a se apresentar no primeiro dia do seminário.
A primeira apresentação versa sobre o Grande Inquisidor, conto do genial Dostoiéwski. Em época de grande endurecimento do tribunal do santo ofício criado pela igreja para combater os hereges, século XVI, época da reforma de Martinho Lutero, Jesus volta a terra e ira ser inquirido pelo Tribunal do Santo Ofício.
A segunda apresentação será sobre Mohamed e as promessas do Islã. Um fictício atentado terrorista em Brasília, coloca em xeque o Islã. O processo jurídico que se desenvolverá será suficiente para desfazer a nossa ignorância e os preconceitos contra o Islã? Por que o ocidente se nega a reconhecer essa fabulosa herança?
Sejam os islâmicos, os cristãos e o judeus, somos todos filhos do mesmo pai Abraão. Esses são os acontecimentos e as motivações e ideologias religiosas e políticas que formaram o pensamento ocidental e constituem o estofo deste seminário. A nossa mensagem é a de necessidade de diálogo e tolerância. Processo não é monólogo, processo é diálogo. É uma espécie de jogo democrático entre razãos e contra-razões, argumentos e contra-argumentos.
O evento prosseguirá na quinta-feira, dia 28, e todos poderemos testemunhar a forte preocupação com uma mensagem de amor para a humanidade.
Como nos ensina o místico indiano Krisnamurt:
“Se desejamos realmente implantar, juntos, a paz e a boa-vontade, precisamos de amor - não o amor ideal, mas o simples amor, a bondade, a compaixão - e isso torna necessário nos libertarmos de uma certa comunidade e lançarmos fora todos os nossos preconceitos nacionais, raciais e religiosos. Nós somos entes humanos, vivendo juntos sobre esta Terra, esta Terra que nos pertence."
A metodologia, no entanto, rompe com a tradicional técnica expositiva e se vale de dramatizações como estratégia para o aprimoramento do conhecimento prático e, sobretudo, o desenvolvimento das habilidades e competências necessárias ao profissional do Direito. Nesse tipo de atividade fica claro para o estudante que não existe prática que não provenha de conhecimentos teóricos. Não existe teoria que não engendre novas práticas. Afinal, direito e teatro são as duas grandes peças do drama humano.
Por fim, o nosso agradecimento especial à Diretoria da Faculdade de Direito na pessoa de nossa querida Diretora, Profa. Dra. Amanda Flávio de Oliveira e de nosso estimado vice-diretor Prof. Fernando Gonzaga Jayme. E também à Fundação Valle Ferreira pelo valioso apoio financeiro.
Nosso agradecimento ao Departamento de Direito e Processo Penal onde tenho a oportunidade de conviver com brilhantes profissionais, sempre apoiando as nossas ações extensionistas, aqui representado pelo ilustre chefe Prof. Marcelo Leonardo.
Nosso agradecimento ao Centro Acadêmico Afonso Pena que sempre tem oferecido apoio incondicional às atividades que têm em mira o crescimento cultural e intelectual dos estudantes.
Esse evento integra os 120 anos da nossa Faculdade e os 80 anos da OAB que nos ofereceu também excelente apoio financeiro.
Meus agradecimentos aos estudantes de Processo Penal, turmas C e D, turno da noite da Faculdade de Direito da UFMG, ainda no 5º semestre, e que aceitaram de bom grado esse grande desafio, que significa não apenas superar a timidez, mas desenvolver a capacidade de problematizar, e pesquisar, aprender a fazer e a ser, aprender a conviver, fazendo com que a universidade cumpra com o seu verdadeiro papel de formar recursos humanos de alto nível. O meu muito obrigado também à equipe do Cerimonial que não mediu esforços para nos proporcionar evento da melhor qualidade.
Por fim, agradeço a presença de todos que vieram prestigiar os colegas, professores, alunos, familiares e os funcionários desta nossa Vetusta Casa de Afonso Pena. O nosso especial agradecimento à seleta comissão examinadora.
Muito obrigado.
Prof. Sérgio Luiz Souza Araújo